O TRONCO
JOÃO RODRIGUES
Certo dia, um homem de meia idade, resolveu sair da sua casa, indo assim, sem destino. E ele seguia rumo ao nada. Nem sequer quis se despedir da sua esposa e dos seus filhos. Seguiu estrada afora. Até parecia que a floresta sorria de ti. E quando já era tarde, o seu corpo cansado de tanto andar, Ele resolveu assentar-se num velho tronco que estava à beira da estrada. Quando se assentou, o velho tronco falou:
- Hein! Nem sequer pediu licença!
Quando o tronco falou, o homem pulou para o alto e assustado exclamou:
- Tronco não fala!
No entanto o tronco continuou dizendo:
- Eu sei que tronco não fala. Porém, eu falo. Estou aqui há quatrocentos anos, e muitos hipócritas como você já passaram por aqui. E quando eu falei com eles, uns caíram duros do meu lado, e outros, porém, devem estar correndo até hoje. Você parece que é forte, pois não caiu e nem correu. Apesar de ser um hipócrita e estar indo embora rumo ao nada, deixando para trás a sua esposa, que por sinal é muito bonita e que você nunca se preocupou com ela. Você nunca agradeceu nem mesmo por um prato de comida que ela te serviu à mesa. E os seus filhos? Nem sequer se despediu deles. Haja vista que vejo alguma coisa boa em você. Por isso, queria te pedir um grande favor?
- Que favor?
- Gostaria que voltasse para sua casa, e se possível fosse, que me levasse com você. Que me pusesse ali, num jirau debaixo de uma coberta, onde eu pudesse ficar ali sem tomar a chuva e nem o sol, sem sofrer a dor da lepra do cupim e da formiga. Que eu não ficasse à mercê do frio e do calor. E por fim, que eu não sofresse esta dor infernal da solidão, que venho sofrendo ao longo de quatrocentos anos. Sabe! Eu sei que muitas vezes sinto vontade de que alguma coisa boa pudesse acontecer a mim...
O homem olhou para o tronco e sem decidir ele parou. Eu agora pergunto a você que está lendo esta história, nesse espaço que lhe darei. Se fosse você? Levaria o tronco? Voltaria prá sua casa carregando um tronco?
?
Não sei qual foi a sua resposta, porém, o homem da minha história, cabisbaixo e pensativo, relatou:
- Eu te levarei.
- Obrigado Tim, muito obrigado. Não tenho mãos para bater palmas, não tenho lábios para sorrir como você, Porém, te dou o meu muito obrigado.
Tim colocou aquele velho tronco nas costas e voltou prá sua casa. E assim que eles seguiam estrada afora, o tronco disse:
- Sabe Tim, como era bom naquele tempo em que eu era árvore, lembro-me que na primavera a nossa folhagem caía. Deus nos mandava um vento frio para refrescar os nossos caules. Como era gostoso Tim... Logo depois, Ele nos mandava uma chuva fina e nós bailávamos e formávamos uma canção. Ha que saudades daquele tempo. Nós, no entanto, dávamos em agradecimento ao Senhor Deus, a floresta cheia de flores. De modo que num dia infeliz, o maldito progresso passou por aqui, foi aí que me tornei neste velho tronco que você está carregando. É Tim. Quantas vezes eu desejei que o fogo me consumisse quando eu via a floresta queimando. Eu me sentia feliz. Só que o quê chegava perto de mim era aquela maldita fumaça preta. Eu sentia até o calor das chamas. No entanto, elas não podiam me consumir por que fiquei a beira deste caminho infernal. Olha Tim, você, por exemplo, é um hipócrita, nunca teve o privilégio de olhar para as pessoas, de agradecer pelo o que elas fizeram por você, tem tantas coisas Tim, que você não fez.
Naquele momento em que o tronco falava, Tim não gostou. O atirou no chão e relatou:
- Não acha que está conversando muito? Eu bem quê podia colocar fogo em você, e depois! Hem! Depois você se tornaria em cinzas, e aí?
Aí o tronco disse para o Tim:
- Tudo bem Tim, vá em frente, ponha fogo em mim, deixa que eu me transforme em cinzas, Só que aí Tim! Ninguém irá saber da nossa história, ninguém irá acreditar em você. Não irá saber que você me conheceu. Ninguém irá saber o que acontecerá a nós dois quando chegarmos a sua casa. Vamos Tim, acabe logo comigo. Vamos. Eu sei que você é um fraco, que não tem coragem de fazer isso comigo, por que os hipócritas são fracos Tim. Eles não têm coragem de fazer tal coisa, vamos.
Tim se assentou ali no chão, bem perto do tronco. Meio triste, se sentindo envergonhado, disse para ele:
- Sabe cara! Você fala com tanta profundidade, parece me conhecer, e parece que isso é uma coisa até mesmo acontecida bem antes de mim. Talvez tão misteriosa que isso deve ter se dado bem antes mesmo do meu simples nascimento, como isso, bem antes mesmo de eu vir a terra.
Aí o tronco fez um grande silêncio, depois disse para o Tim:
- Vamos Tim, ainda quero ver os raios do sol adentrando-se em sua casa quando lá chegarmos. Quero ver o quanto é belo o lugar onde eu irei passar a minha eternidade. Quero saber Tim, antes de tudo, cada detalhe do meu tão desejado lugar. Se for que vamos, vamos.
Assim, Tim e o Tronco continuaram seguindo estrada afora. Daquele momento em diante, Tim começou a agradecer ao nosso Senhor Deus, por tudo que via ao seu redor. Ali, Tim agradeceu ao vento, agradeceu pela relva, agradeceu pela própria estrada que ele seguia, pela terra que ele pisava, pelos pássaros que cantavam, por tudo que ele via em sua frente. Até que quando os últimos lindos, brilhantes e incomparáveis raios de sol, pairavam sobre o telhado da casa de Tim. Ele chegou com o Tronco. Naquele momento de grande ou talvez quem sabe, de inigualável emoção. As suas lágrimas cobriam as suas faces. Cobriam também as faces da sua linda esposa e dos seus maravilhosos filhos que vieram recebê-lo no terreiro, e assim a sua linda esposa indagou:
- O que fizeste o dia todo?
No momento a resposta de Tim, foi um olhar de gratidão nos olhos dela. E o tronco relatou:
- Está vendo Tim! Não te disse que ela era linda!
As lágrimas de Tim, não paravam de descer na sua face, e a sua voz embargada de emoção, não lhe deu a condição de responder ao comentário do tronco. Que continuou dizendo:
- Não fique triste Tim, só nós dois conseguimos ouvir um ao outro, ninguém mais nos ouve.
Aí Tim chamou os seus filhos e disse-lhes:
- Lucas, você e Pedro, coloquem este tronco lá naquele jirau na casa da roda.
Depois da ordem, Tim foi abraçado com a sua linda esposa, lá para a cozinha, antes, porém, de ali chegar, ouviu os seus filhos gritarem:
- Papai, o tronco quebrou.
Tim foi para lá, nem sequer tinha chegado à cozinha para comer alguma coisa depois de um dia de talvez, ou um dia de uma lição de moral ou dia de quem sabe, um dia de um acerto de contas ou até mesmo um dia de algo inexplicável. Pois ao chegar lá na casa da roda, viu o tronco caído ali no chão, e partido ao meio. E lá de dentro do seu oco tinha saído um grande tesouro. Tim chorando e ao mesmo tempo sorrindo. Tomando aquele tesouro em suas mãos, aquelas lindas moedas de ouro, aquelas pepitas, aquelas jóias de diamante. E foi lá pro meio terreiro. Levantou as suas mãos para os céus, e disse:
- Deus! Muito obrigado Deus! Agora eu sei Deus, eu sei que tronco não fala, era com você Deus, era com você que eu falava, era com você Deus...
Tim passou a noite inteira lá no meio do terreiro da sua casa, conversando com as estrelas, e até dizia a elas:
- Não sei qual é de vocês que é Deus. Porém, eu sei que você está me vendo Deus. Muito obrigado por ter me dado este grande privilégio, este privilégio de ter falado com você...
De maneira que no dia seguinte, Tim pegou aquele tesouro e com ele comprou todas as terras que existiam por ali. Construiu uma grande casa à margem da estrada, nela Tim fez uma enorme varanda, e com o resto do tronco, fez uma cadeira de balanço, e ali, Tim ficava. Passava o seu tempo sempre ali. Ali naquela grande e confortável cadeira feita com o resto do tronco. De lá dava para o Tim ver as pessoas que passavam pela estrada. E elas sempre quando passavam ali, gritavam:
- Tim! tudo bem?
Tim acenava as mãos para elas, e com muita alegria, dizia:
- Que Deus vos acompanham...
E por muito tempo Tim ficou ali. Abençoando as pessoas que passavam por aquela estrada. Um dia, no entanto, alguém passou e gritou:
- Tim, tudo bem?
Tim, no entanto não respondeu. Tim estava lá. Lá naquela cadeira feita com o que sobrou do tronco. Tim estava parado, nem sequer mexia mais. Tim estava lá. Sim, estava como uma grande pedra. Tim estava frio. Por que a vida é assim. Ela tem o seu fim, tem o seu tempo. Como tudo passa. Aquele dia fez passar. E passou o tempo. Passou o tempo de Tim. E o seu tempo? Hem! O seu precioso tempo, quando será? Quando haverá de passar o seu tempo? Eu gostaria que você pensasse sobre isso!
FIM
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