quinta-feira, 27 de abril de 2023

O Águia João Rodrigues

 O ÁGUIA

 

JOÃO RODRIGUES

 

            Um temido Coronel Horácio poderoso chefe de pistoleiros, instalou-se numa região matando os fazendeiros e ficando com suas terras. Até que só restou um pequeno fazendeiro, que o Coronel não quis matá-lo, mas pediu a ele que desocupasse a fazenda e fosse viver em outro lugar. O fazendeiro, no entanto não manifestou interesse em sair, alegando que ali era o seu lugar e que macho nenhum o tiraria dali. O Coronel Horácio não ficou satisfeito com o comportamento do fazendeiro e ordenou ao seu capataz:        

            - Agenor, vá até a casa de o Januário ver se ele já desocupou “minhas” terras

            - Sim, Coronel. E o que devo fazer se ele ainda estiver lá? 

            - Diga a ele que se não sair ainda hoje, irei matá-lo. Não sei o que estou esperando - murmurou o Coronel olhando nos olhos de Agenor.

            - É, Coronel, tem coisa que nem mesmo agente sabe o porquê     

            - O que está querendo dizer com isso, Agenor?         

            - Quero dizer, Coronel, que ele está em seu lugar e não tem pra onde ir.

            - Isto não me interessa Agenor. Só me interessam as terras, nada mais do que as terras. Vá e dê o meu recado a ele.

            - Sim Coronel. Vamos pessoal!- Gritou Agenor aos colegas.          

            Agenor saiu com os demais pistoleiros em direção à casa do Januário. Sentia, porém, seu coração cortado por ser portador de um recado que, ao seu ver, era uma grande injustiça. Ele se pudesse, faria tudo para ajudar o Januário a sair das terras para não vê-lo morrer, talvez até mesmo por suas mãos, pois era ele o capataz do Coronel. Não sabia por que, mas tinha pena do Januário. Depois de horas de muita correria, chegaram à casa do Januário e parando seus cavalos na porteira do pequeno quintal, formando uma enorme nuvem de poeira, Agenor gritou:         

            - Januário, saia pra fora, eu trouxe um recado do Coronel pra você.         

            Januário, saindo na pequena porta da casa, foi humildemente em direção aos pistoleiros e disse:           

            - Que recado moço?          

            - Agenor, Januário, meu nome e Agenor.        

            - Sim, Agenor, qual o recado?

            - O Coronel Horácio mandou-me falar que você desse o fora das terras “dele” ainda hoje ou ele virá matá-lo.             

            - Mas eu não estou nas terras do Coronel coisa nenhuma. Estou nas minhas terras e vou ficar aqui. Diga lá pra este Coronel insistente que me deixe em paz. Vi tudo o que ele fez na região e não o atrapalhei em nada. Eu só tenho minha vida, minha mulher e meus filhos e este lugar e agora vem este Coronel lá do meio dos infernos pra me tirar o sossego! Mande este Coronel de uma figa esquecer-se de mim, mande esse desgraçado pro inferno! 

             Januário falou o que quis e entrou novamente pra sua casa. Agenor ficou olhando aquele coitado sem nenhuma defesa. Sentia pena dele, pensou em ajudá-lo, mas se viu sem condições. Deu as rédeas do seu cavalo pra voltar, ordenando aos companheiros:

            - Vamos, gente, vamos embora!

            Assim, os pistoleiros saíram correndo de volta à fazenda do Coronel.

 E ao chegarem encontraram-no na varanda da casa.         

            - E então, Agenor, o homem já foi embora?

            - Não, Coronel, ele ainda está lá.                         

            - Mas você deu meu recado a ele?            

            - Sim Coronel.         

             - E ai?          

            - Ele disse que não vai sair de lá porque ali é o seu lugar e não tem pra onde ir. Disse também que o senhor o deixasse em paz e fosse pro inferno.                       

            - Então ele teve coragem de me mandar pro inferno?           

             - Teve Coronel. Ele falou!

            - Porque não deu um tiro na cabeça dele idiota?       

            - Não Coronel, na verdade ele está com razão, está no lugar dele.                       

            - Quem é que tem razão, Agenor?         

            - Bem Coronel, eu não quis dizer o senhor razão.     

            - Assim está melhor. Amanhã bem cedo vamos até lá, pois quero mostrar a ele como se manda um homem pro inferno.    

            No dia seguinte, os raios solares faziam brilhar a sede da linda fazenda do Coronel Horácio. Fazenda esta conseguida na bala, matando um por um dos fazendeiros como se matassem animais na selva. Agenor e os demais pistoleiros já estavam preparados para receber as ordens do Coronel:   

            - Agenor, está tudo em ordem?   

            - Sim, Coronel, estamos à sua disposição

            - Então vamos à casa do Januário ver se ele é mesmo tão corajoso a ponto de me mandar pro inferno cara a cara - resmungou o Coronel Horácio sentindo-se revoltado com o insulto.

            E o Coronel com seu bando desceu a serra em direção a casa do Januário. Este, indefeso, estava ali em suas terras, cuidando de seus afazeres, lutando para cuidar de sua mulher Dalva, sua filha Domitila, e seu filho João, que já rapazinho o ajudava a cuidar da criação e da lavoura.        

            - Está ficando perto, Agenor, vamos preparar as tochas de fogo, pois vamos queimar a casa com tudo o que estiver dentro. Só deverá sobrar cinzas, somente cinzas - disse o Coronel satisfeito.

            - Mas Coronel, isto é crueldade! 

            - Agenor se você repetir isso, será um homem morto, entendeu? - falou o Coronel descendo do cavalo.           Todos tem mais alguém contra que eu acabe com Januário?        

             Um pistoleiro chamado Sebastião falou:         

             - Eu, Coronel, sou contra.           

            O Coronel, sacando de o seu revolver, deu um tiro no peito do Sebastião que caiu sem vida.           

            - Será que ainda tem mais alguém que é contra minha decisão?  

            Ninguém respondeu a pergunta e todos calados, procuraram preparar as tochas de fogo. Seguiram em frente, logo chegaram à casa do Januário, jogando as tochas no telhado e atirando nas portas. Neste momento, João conseguiu fugir por uma janela, escondendo-se em uma moita de cana, e ficou assistindo a grande violência sem nada poder fazer, ouvindo o Coronel gritar:   

            - Januário, saia pra fora!   

            O Januário saiu no terreiro enquanto o Coronel, desmontando do cavalo, ia a sua direção dizendo:       

            - Vim ver se você é mesmo de coragem, Januário, se é capaz de mandar o Coronel Horácio pro inferno!         

            E o Coronel falava ao mesmo tempo em que atirava no Januário, João, escondido na moita de cana, via as balas entrando no tórax do seu pai e o mesmo caindo no chão sem vida.

            - Ninguém manda o Coronel Horácio pro inferno, entendeu Januário?   

            Enquanto isso o bando matava Dalva e sua filha queimando-as dentro de casa, achando que João também estivesse ali. João a esta altura, já estava correndo para bem longe, horrorizado com o que viu. Escondeu-se na floresta até que os viu passarem correndo, deixando uma nuvem de poeira, um rastro de desgraça e uma dor sem fim no coração de um pobre coitado que, desesperado, seguiu floresta a fora, sem destino.         

            - Oh! Senhor! Dê-me forças para sair deste pesadelo. Oh! Senhor! Ajude-me, Senhor!- Implorava João, estendendo as mãos para o céu.

            João não sentia vontade de voltar, pois sabia que se voltasse seria assassinado pelo Coronel Horácio. O que lhe restava era fugir, fugir pra bem distante dali. Mas ir pra onde? Não tinha ninguém por ali, nem amigo, nem parente, ninguém. Tudo o que tinha havia acabado de ser transformado em cinzas.  Só o que lhe restava era fugir. Assim foi andando, andando pela floresta. Subiu montanhas, desceu montanhas, atravessou campinas e vales, passando fome, dormindo pelo mato e correndo o risco de ser devorado por onça. Mas andou, andou até que suas forças acabaram e na beira de um lago no pé de uma serra, desmaiou perdendo os sentidos.

            - Mãe, tem um rapazinho caído aqui, venha ver! - disse uma pequena à sua mãe

            - Um rapazinho, e está doente? - interrogou a senhora.

            - Vamos levá-lo, mãe, vamos cuidar dele!        

             - Vamos, filha, coitado, está quase morto!       

            A senhora e sua filha levaram João para casa, onde o colocaram numa cama e procuraram cuidar do rapaz.                 

            - Como será que ele se chama mãe?    

            - Não sei filha, depois ele vai falar           

            - Respondeu à senhora preparando um remédio para o rapaz.                 

            - Mãe, ele deve ter um nome bonito!      

            - Deve ter filha.       

            Neste instante vinha chegando da roça um senhor que já de certa idade, sua roupa suja de carvão e o suor no rosto, banhando uma imagem de cansaço e pobreza. Ao entrar na casa, vendo o rapaz deitado na cama, disse:     

             - Quem é este rapaz, Jurema?               

            - Não sei Francisco, o encontrei na fonte, estava lá desmaiado.    

            - E não falou nada ainda?                       

             - Não, pai, não sei o nome dele - relatou a menina.

            Francisco encostou-se no rapaz e disse:         

            - Coitado, está desacordado! Parece que tem muito tempo que não come nada.           

            Sua esposa, passando um remédio. Num pano embebido na testa do rapaz, dizia:     

             - Ele vai ficar bom, logo saberemos quem ele é.        

            João, porém, não dava sinal de melhora e assim passaram vários dias até que...         

            - Mãe, ele está se movendo, está voltando, esta se levantando!     

            Jurema veio correndo e segurando o rapaz disse:     

            - Calma, meu filho, fique deitado. Não ande agora, medite um pouco, sente-se na cama, pense primeiro onde está e retorne os sentidos.         

            - Mas onde estou e quem é a senhora?           

            - Sou Jurema, esposa do Francisco e esta aí é minha filha Flor. Encontramos você na fonte, estava lá caído. O trouxemos pra cá cuidamos de você e desejamos vê-lo bom logo.   

            - Por que cuidaram de mim, de onde sou e quem sou?        

            - Isto não sabemos e só você pode responder isso.   

            - Não sei senhora, não sei quem sou. Vão embora, deixe-me em paz, vão embora!

            - Filho, deite-se, fique tranqüilo. Nós vamos cuidar de você.          

            - Não preciso de ninguém pra cuidar de mim, vão embora. 

             Na verdade, João havia perdido os sentidos, tinha perdido a memória e não sabia quem era ele.

            - Coma isso, filho, vai fazer-lhe bem - relatou Jurema dando um pouco de comida para o rapaz.           

             João, comendo com uma grande vontade, parecia um animal selvagem. Depois que acabou de comer, deito-se e foi dormir novamente.           

            - O rapaz acordou Jurema?         

            - Sim, Francisco, ele acordou, comeu e depois dormiu.        

            - E disse seu nome?         

            - Não, não sabe quem é ele.       

             - Como? Não entendi, não sabe quem é ele?

            - Sim, não sabe quem ele é. Acho que perdeu a memória.  

            - Coitado!     

            - Ele vai ficar bom, pai, já esteve pior.

            - De onde será este rapaz? - Murmurava Jurema, olhando pela a porta da frente da casa a enorme montanha que João havia atravessado, fugindo do perigo.

            João agora estava dormindo, estava longe, sonhando. Na verdade, estava vivendo, dormir para ele era viver, porque sem memória seria melhor.       

            - Pai, ele não disse como se chama. Como será o nome dele?      

            - Não sei filha, deve ser um bonito nome. Ele me parece um bom menino.         

            - Será que ele vai gostar de mim pai?

            - Vai, filha, quem não gosta de você?   

            - E a senhora, mãe, acha que ele vai  gostar de mim?          

            - Vai, Flor, ele vai gostar de todo mundo.

            - Seria bom mesmo, afinal não temos nenhum rapaz aqui - relatou Francisco, olhando para Jurema que servia a comida para ele, demonstrando gratidão.

            - Venha jantar, Francisco, já está ficando tarde,         

            - Eu também quero mãe.

            - Pode servir pra você, Flor, sua mãe está cansada.  

            - Certo, mãe, pode deixar que eu me sirvo.      

            Assim os três se serviram e jantaram olhando pro quarto onde João estava dormindo.

            - O senhor está triste, pai?  O que está pensando?   

             - Nada, Flor, só estou pensando na vida.          

            Francisco estava mesmo pensando na vida, ele era um homem errante que num certo dia desprezou tudo que o tinha e saiu pelo mundo em busca de aventuras. Os anos se passaram e nada conseguiu. Até que certo dia, numa cidadezinha ali perto da serra, conheceu Jurema e por ela se apaixonou. Então se casaram e foram viver ali nas terras que pertenciam aos seus avós. Francisco, ainda jovem. Começou desbravá-las e cultivá-las. Ali nasceu Flor que já completara seus dezesseis anos, a única filha que Jurema deu ao seu marido. Francisco, vendo João, quase da mesma idade de Flor, sentia vontade de que João ficasse bom e que permanecesse ali pro resto da vida.

             - Francisco, ele deve ser quase da idade de Flor, não acha?        

             - Parece, Jurema.  

            - Não, ele é mais velho do que eu - retrucou Flor apreensiva.        

            - Deve ser mesmo - confirmou Francisco olhando para filha.         

             Flor era uma linda morena com cabelos pretos que batiam nos ombros, os olhos pretos e arregalados, um sorriso encantador e tinha corpo meigo e sedutor que se escondia na inocência de uma pura e simples sertaneja. Vivia na mais completa fantasia de um olhar sem maldade que se atirava ao longe, nas montanhas e florestas cobertas de belezas naturais.

            - Flor, levante-se já está tarde!    

            - Flor acordou assustada e disse!                      

             - Onde está o rapaz?        

            - Ele já se levantou, está lá fora conversando com seu pai.

            - Então quero vê-lo.           

            - Pois não, senhorita, está falando de mim?    

            - Ah! Sim, estava preocupada com você.

             - E o que lhe faz preocupar?      

            - Bem, na verdade, não sei, Só sei que gostaria de saber como se chama!         

             - Não sei como me chamo, sinto minha cabeça meio soando, ouço vozes e gritos. Porém não consigo entender, não sei de onde sou, mas espero que descubramos.

            - Certo, farei tudo pra lhe ajudar. O meu nome é Flor.           

             - Bonito nome, Flor, foi um prazer. O meu nome é... Não sei... Sei lá que nome eu tenho!     

            E João colocou a mão na cabeça, dizendo:

            - Temos que descobrir o meu nome!     

            - Mãe, como vamos ajudá-lo a descobrir o nome dele?         

            - Temos que chamá-lo por vários nomes que ele entenda por um e este será o nome dele.   

            - Não, senhora, eu não tenho qualquer nome, eu devo ter um nome de quem será que eu sou filho? 

             - Deve ser filho de algum fazendeiro.  

             - E a senhora sabe de onde eu vim?    

             - Não, encontramos você na fonte, não sabemos de onde veio.   

            - Senhor Francisco, o que eu posso fazer pra ajudá-lo? Não quero ficar de mãos abanando, ou eu ajudo o senhor ou vou embora. Porém pra onde eu devo ir, não sei.              

- Você não vai, filho, por enquanto você fica aqui e sem fazer nada. Depois que estiver bom você pode me ajudar.      

            - Certo senhor Francisco, muito brigado.

            João era muito educado, pois o seu pai tinha um cuidado especial por ele. Era muito perfeita a criação do Januário.

            - Filho, pode ficar a vontade que vou pra roça.           

            - Tudo bem, senhor Francisco, tudo bem.        

            Francisco foi pra roça cuidar da plantação, pois dependia da lavoura a sua sobrevivência.

             - Jurema, cuide direito dos meninos.    

            - Pode deixar Francisco.   

            Jurema ficou olhando o pobre marido com a enxada nos ombros, desaparecendo ao longe no caminho, enquanto seus olhos se perdiam na imensidão de sua mente, no vazio do seu pensar na fronteira sem limites das incertezas da vida. Vida cheia de mistérios e segredos que se tornam cada vez mais  indecifráveis.

            - Senhor Francisco, já se faz muito tempo que estou em sua casa, dando trabalho. Nem sei como posso pagar tudo isso!

            - Nada filho você não me deve nada. Afinal foi e está sendo muito bom pra mim você estar em minha casa. Eu sempre tive vontade de ter um filho e como não foi possível, o tempo me deu você. Pode ficar em minha casa o tempo que você desejar.

            - Obrigado, senhor Francisco, mas é tão ruim a gente viver assim! Nem sabemos quem sou, será que tenho pai e mãe, será que tenho irmãos? O senhor conhece está região. Será que não se lembra de mim de algum lugar? Ou será que eu já morri e estou aqui sem estar?

            - Não, filho, você não morreu - retrucou Jurema.       

             - E você, Flor, o que acha?         

            - Acho que não. Você deve ser filho de alguém do outro lado da serra, lá na  região das águias.

            - Águia? Você disse águia? Gostei desse nome, pode me chamar de Águia.     

            - Que bom! Já temos agora um nome pra você  - acrescentou Francisco.

            - Águia nunca pensei que fosse conhecer um Águia!-Brincou Jurema.  

            - Águia, eu gostaria de saber quem é seu pai e sua mãe. Vou ajudá-lo a descobrir quem são eles.           

            - Obrigado, Flor, eu fico muito grato pela sua boa vontade comigo. Não só você como também sua mãe e pai, sou muito grato a vocês.       

            - Não é nada, Águia, estamos fazendo o que podemos, afinal, você é mesmo muito gentil com a gente e, além disso, você transmite uma grande energia pra gente, você nos dá força.

            - Interessante senhor Francisco, isto é mesmo muito interessante. Eu consigo transmitir energia?           

            - Sim Águia. Sei lá, é uma sensação gostosa de viver quando a gente está ao seu lado.        

             - E a senhora, como se sente? - perguntou Águia a Jurema.

             - Sinto o mesmo que Francisco disse.  Sinto que você é muito bom e que trouxe sorte pra nós.

            - E você, Flor, como se sente?    

            - Bem, Águia desde o instante que o vi na fonte, eu sinto, na verdade, vontade de ficar ao seu lado. Talvez eu pense numa coisa e pode ser outra. 

            - O que, por exemplo?       

            - Não sei. Uma coisa qualquer que eu não posso ainda saber.      

            O que Flor sentia por João, na verdade era o que se pode chamar de amor à primeira vista. Ela estava era gostando dele.

            - Existem coisas que nem mesmo a gente pode saber! - Exclamou Jurema olhando pra filha.

             - Águia hoje podemos ir juntos pra roça, você já está bom. 

            - Que bom senhor Francisco, ouvir isto. Eu já estava querendo ir mesmo sem o senhor me convidar.      

            E João saiu andando com Francisco pelo caminho afora até chegarem à roça onde havia uma grande plantação.

            - Senhor Francisco, quanto tempo faz que o senhor cultive está terra?   

             - Já faz uns vinte anos, Águia, por quê?

            - Sei lá, me deu vontade de perguntar. 

            - Quando eu cheguei aqui, Águia, tudo isto era mata bruta. Comecei lá naquele canto, depois fui pondo roça e veja onde já estou! - Falava Francisco mostrando as roças com muita alegria.

            - O senhor lutou muito e nunca contratou ninguém pra ajudá-lo?

            - No inicio alguns me ajudaram, mas depois eles morreram e eu acabei ficando só.

            - Mas morrerem assim de qualquer jeito?

            - Não, morreram em combate de pistoleiro contra pistoleiros.            - E o que eles eram do senhor?           

             - Eles eram irmãos e primos de Jurema.

            - E morreram todos?

            - Sim morreram todos.       

             - E as terras deles ficaram com quem?

            - Deve ter ficado com os criminosos

            - Por que eles não atacaram o senhor?

            - Eles não sabem de mim. Acham que fui pro outro lado da montanha, assim não me incomodam aqui.

            - Então o senhor vive ilhado? Não pode nem ir à cidade?

            - Isso mesmo. Não posso ir lá desde que me casei.

            - Então Flor não conhece a cidade?       

             - Não, Flor nunca viu outro lugar a não ser este aqui.

            - Eu gostaria de ir à cidade, conhecer as pessoas, conversar com alguém, quem sabe descobrirei quem sou!

             - Mas é muito perigoso, Águia.

            - Não vejo nenhum perigo. Eles não sabem quem sou. Pode ser que eu seja de lá e não sei.

            - Eu ainda acho que você não deve ir. Os pistoleiros matam mesmo. Lá existe tal de Coronel Garcia que manda matar quem ele bem entende. Não sei como ele ainda não descobriu que estou vivendo aqui. Se eles descobrir serei um homem morto.

            - Mas isto não pode continuar assim. Senhor Francisco. Isto é um abuso! O senhor socado neste ermo de mata, vivendo como índio só porque tem um Coronel que manda e desmanda numa cidade! Um home deste tem que ser morto, ser enforcado!

            - Concordo com você Águia, no entanto, nada podemos fazer. São Coronéis que mandam, são os donos de tudo, são donos do dinheiro. Eles compram tudo o que querem, compram as leis, e os homens da lei!

            - Sim, eles compram tudo, mas será que compram a morte?

            - Não Águia, ninguém compra a morte. Ninguém quer morrer.

            - Ah! Então eles, os Coronéis, não gostam de morrer, só gostam de matar, pagam pra matar!

            - Águia, eles são assim, sempre foram assim. Pra todo lado que a gente vai é assim. Quando eu saí de casa, em busca de aventuras, por todos os lugares que passei só encontrei desgraça e todas as desgraças nesta terra são causadas por Coronéis. Assim Águia, eu resolvi assumir a condição de ficar só no mato, aqui pelo menos a natureza divina me protege.           

            - Mas o senhor só está protegido até os Coronéis não o encontrarem!

            - Isto mesmo, filho, ou a não ser que eu me junte ao seu bando.

            - Como? Matando as pessoas pré eles?           

            - Sim, a troco de nada. Pistoleiro, Águia, não tem família, suas mulheres pertencem aos Coronéis, eles usam qualquer mulher. Basta que elas lhes agradem e assim as usam como se  fossem objetos.

            - Mas isto é um absurdo, senhor Francisco!

            - É, Águia, eu também acho, mas o que fazer?

            - Matá-los!

            - Mas como, Águia? Eles são poderosos e tem tudo a seu favor.

            - Podem ter tudo, senhor Francisco, menos uma coisa.

             - O que, por exemplo, Águia?

            - A verdade, senhor Francisco, a verdade, se agirmos com a verdade encontraremos uma solução e assim derrotaremos os Coronéis.

            - Não adianta Águia, nossa verdade, se tornam mentiras diante dos Coronéis enquanto suas mentiras se tornam verdades.

            - Sendo assim, senhor Francisco, só tem um jeito.

            - Qual Águia?

            - Usar a inteligência para matá-los.

             - Como assim?

             - Primeiro treinar, ser um ás no gatilho. Segundo agir com astúcia, pegá-los desprevenidos e, finalmente, eliminá-los sem perdão.

            - Mas pra isso temos que ter um motivo.

            - Mais um motivo? O senhor ainda está querendo motivo pra matar quem vive escravizando nosso povo, desonrando nossas famílias e matando nossos irmãos? Será que isto não é motivo de guerra e de vingança? Temos que acabar com estes malditos Coronéis, estas pestes!

             - Eles são muitos, Águia, existem em todos lugares da terra

            - Isto não importa. Temos que acabar com os nossos, os demais ficam por conta de outros homens tão destemidos quanto nós. E assim, futuramente, todos serão iguais ou, pelo menos, esmo que não sejamos iguais, existirá mais respeito para com o próximo.

            - E o que pretende fazer, Águia, já que nem armas temos?

            E muito fácil. Eu só preciso de um cavalo possante e o resto pode deixar comigo.       

             - Porque vai sozinho?

            - Por enquanto vou sozinho procurar adeptos entre os fazendeiros desprotegidos. Vou convidá-los pra unir às nossas forças e juntos seremos fortes e derrotaremos os Coronéis.

            - Pode até funcionar, mas tenha cuidado. Existem muitas pessoas falsas e traidoras. Às vezes é só você dar as costas e elas vão correndo avisar o Coronel.

            - Com isso eu me arranjo. Irei prevenido para qualquer traição que por acaso venha acontecer.           

            E assim, depois de um dia de muito trabalho e meditação João estava mesmo disposto a ir procurar ajuda para eliminar os Coronéis. A noite, na casa de Francisco, após o jantar, começaram seus planos.

            - Senhor Francisco, eu vou sair à busca de companheiros para lutar contra o Coronel Garcia. Vamos eliminar estes pilantras da face da terra.

            - Águia, você já tem algum plano?

            - Tenho. Como o senhor já me deu as coordenadas da região, vou procurar os fazendeiros que ainda estão vivos e convidar os seus filhos para lutarem com a gente.

            - Cuidado, Águia, os Coronéis são muito perigosos. Nunca me esqueci do dia em que matarem meu pai. Coitado! Morreu inocente, não devia nada, atiraram nele sem mais nem menos!

            - Tudo bem, Jurema. Deixa comigo, vou aventurar. Quem sabe ainda podemos vingar a morte de seu pai!

             - E eu lhe agradecerei Águia, por tudo.

            - Nada, Flor, não tem nada que agradecer.

            Depois que João se despediu do pessoal foi seguindo um caminho desconhecido, caminho este que estava cada vez mais distante de sua terra. Ele porém, achava que estivesse indo pra casa e que logo encontraria seu pessoal. No entanto, sabia também que poderia encontrar a morte. Montado num cavalo rosilho, vestido uma roupa de couro e com uma pequena faca na cintura, ele não parecia, na verdade, um pistoleiro e sim um pobre índio sem tribo. Diante de tanta incerteza, João era mais um pagador de sofrimento causado por um Coronel que, na verdade, ele nem sequer sabia quem.

            - Ali tem uma casa, deve ser algum fazendeiro. Será que ali é a casa do meu pai?

            - Perguntava João a si mesmo.    Chegando à porteira do quintal, João chamou:

             - Ô de casa!

            De dentro da casa veio uma senhora e disse?

            - O que deseja vaqueiro?

            - Como vai, senhora? Eu gostaria de falar com seu marido.

            - Eu não tenho marido. O desgraçado do Coronel Garcia matou a poucos dias...          

             - Coronel Garcia? Ah! Sim! Coronel Garcia!

             - Você trabalha pro Coronel, vaqueiro?           

             - Não, senhora, de jeito nenhum. Eu estou é à procura de companheiros para lutar contra o tal Coronel.       

             - E o que ele fez a você?

            - Bem, na verdade, nada. É que não consigo agüentar ver as pessoas falarem que os Coronéis vivem matando tanta gente!        

            Neste instante, vinham chegando três rapazes mal-encarados. Desmontaram dos cavalos e seguiram em direção ao rapaz e a velha dizendo:

            - Quem é este cara, mãe?

            - Não sei filhos.

            - Eu sou Águia, rapazes. Meu nome realmente não é Águia.

             - E qual é o seu nome?   

             João, contou o caso para os rapazes.  

            - E esta é a história. Preciso de vocês, estou disposto a lutar até o fim.

            - Estamos com você, Águia, estamos de acordo - confirmou um dos moços, o mais mal-encarado.

             - Ótimo amigo - falou João, dando a mão ao moço.

             - O meu nome, Águia, è Júlio, este e Juliano e aquele é Juscelino. Ai vem vindo a minha irmã Juliana e esta é minha mãe Judite.

            - Certo Júlio. Precisamos de mais gente, armas e dinheiro. 

            - Juliano, você e Juscelino vão lá pra região do Coronel Ozório e vejam se conseguem homens, armas e dinheiro.   

             - Júlio, tem mais algum Coronel nesta região?

            - Tem, são três Coronéis. Aqui onde estamos é a região do Coronel Garcia, esta região compreende todo este vale. Ali na frente, a montanha se divide em duas e forma outro vale. Lá é a região do Coronel Ozório e lá da região que você veio, do outro lado da montanha é a região do Coronel Horácio.

            - Qual à região você acha que eu pertenço?

            - Você deve pertencer à região do Coronel Horácio ou do Coronel Ozório.         

             Quando Júlio, falou o nome do Coronel Horácio João sentiu que o nome parecia familiar, no entanto não deu pra perceber nada.

             - Então, Júlio. Vamos à procura dos companheiros?

            Saíram à busca de pistoleiros e só retornaram alguns dias depois. Já tinham agora, bastante gente, armas e dinheiro. Somavam-se uns cem pistoleiros, só faltava agora o preparo, treinar e estudar um plano para o ataque final e eliminarem o Coronel Garcia.

            - Bem, gente, conforme os lugares que eu andei estes dias com Júlio, nós não vamos ter muito trabalho para eliminar o Coronel Garcia, no entanto, temos que junto com ele matar todo o pessoal que o acoberta. Caso contrário, pode no meio deles, nascer outro Coronel e todo o nosso trabalho ficar perdido. Por isso temos que matar o Coronel Garcia, o seu bando, matar também o prefeito, o delegado, o padre, o doutor, os professores, e alguns comerciantes que acobertam o Coronel. Temos que matar todos e, em seguida, fazer uma reunião e nomear pessoas para os cargos. Aqueles mais especiais como médico e padre, por exemplo, vamos buscar fora daqui. Certo, pessoal?

            - Certo - Responderam todos ao mesmo tempo.

            Na face de cada pistoleiro estava estampada a vontade de acabar com o Coronel. Cada um deles havia assistido um de seus familiares serem assassinados pelo Coronel e seu bando. E também serem prejudicados na cidade pelo prefeito e comerciantes, pois só os produtos do Coronel é que tinham valor e os deles não valiam nada.

            - Águia, eu acho que já é hora de atacar. O tempo está passando, o Coronel pode suspeitar, temos que apanhá-lo desprevenido.

            - Certo Júlio. Nesta madrugada atacaremos ao mesmo tempo a cidade e a fazenda do Coronel Garcia.

             - E como devemos fazer?

             - Você comanda o grupo que vai atacar a cidade. Não mate as crianças e nem as mulheres que não forem esposas dos pistoleiros. Quanto ao resto, atire em todos, não deixe ninguém vivo. Nomeia em seguida o prefeito e o delegado provisórios e depois decidiremos na reunião.

            De madrugada, enquanto a lua banhava a relva da montanha de orvalho, os pistoleiros preparavam os seus cavalos para enfrentar a sangrenta batalha. Apesar de estarem consciente que nem todos voltariam vivos, era notada, em cada semblante, a vontade de ir e vingar muitas mortes já assistidas por eles.

            - Júlio, a independência da cidade está por sua conta. Comande os seus homens e depois que eu e meus homens acabarmos com o Coronel Garcia seguiremos pra lá.

            - Pode deixar comigo Águia, estamos prontos. Vamos pessoal!

             - Vamos!

             - À batalha, companheiros!

            - Vamos, ei rá!         

            O tropel dos cavalos abalou a madrugada na floresta. Parecia que a própria mata se sentia aliviada e feliz em ver seus verdadeiros sertanejos alegres. A mata parecia sorrir...

            - Atenção, pessoal! Vamos preparar pra atacar, não se esqueçam que o nosso lema é matar.

            - Entendido, Águia. Estamos entendidos!

             - Então podemos atacar!

            Todos os pistoleiros saíram correndo, atirando e jogando tochas de fogo nas casas. João saiu correndo para os fundos da casa do Coronel Garcia enquanto os demais pistoleiros travavam uma sangrenta luta contra os capangas do Coronel. Neste momento João ouviu um capanga gritar:

            - Fuja Coronel! Fuja pro seu esconderijo, temos encrenca!

            - O que está acontecendo, Luiz? O que está acontecendo?

            - Não sei Coronel. É um ataque, uma revolta de pistoleiros. Deve ser mandado pelo Coronel Ozório.

            - Aquele desgraçado! Eu bem podia ter matado aquele homem há muito tempo!          

            Enquanto João assistia à conversa apressada do Coronel e seu capanga, balas ressoavam pelos ares, chamas cobriam as casas, só se ouviam gritos de horror.

            - Suba na carroça, Coronel!        

            Enquanto o Coronel subia na carroça, João aproveitou e se escondeu debaixo dela vendo que subiam também a mulher e duas filhas do Coronel. Depois de todos já acomodados, o Coronel gritou:

            - O que está esperando, Luiz?

            Luiz gritou aos cavalos engatados na carroça. Os cavalos saíram pela passagem secreta, mas neste instante já havia pistoleiros na frente. Luiz foi morto e vários tiros foram dados na carroça, acertando a mulher e as filhas do Coronel que caíram mortas. O coronel só levou um tiro no braço e conseguiu tomar direção da carroça fugindo para o esconderijo.  

            - Vamos, cavalos! Vamos, cavalos!  - gritava o Coronel.

            João saiu debaixo da carroça, pulou para dentro dela e se deitou entre os corpos das filhas do Coronel, fingindo-se de morto. Quando o Coronel chegou ao esconderijo, parou a carroça e gritando aos seus capangas:

            - Cuidado, vem vindo pistoleiros atrás de mim. Eles são muitos, é uma revolta. Cuidado! Não deixe eles entrarem!          

            E correndo pra ver se as mulheres estavam ainda com vida foi surpreendido com João que apontava-lhe uma arma:  

            - Ordene aos seus pistoleiros que joguem as armas fora e venham todos com as mãos pra cima!

            - Quem é você, pistoleiro do inferno!     

            - Depois conversaremos. Agora faça o que eu mandei!       

            O Coronel ordenou aos pistoleiros. Um deles vinha pelas costas de João, tentando atirar nele. Antes que ele sacasse a arma. Porém, foi surpreendido com um tiro na cabeça.

            - Águia deu ou não deu uma ordem para que todos viessem com as mãos pra cima?

- Disse Juliano.

            - Segui a carroça, pois o homem que matou meu pai tinha que ser morto pelas minhas mãos. Eu não podia deixar que outro matasse o Coronel Garcia. Foram muitas noites de pesadelos que eu passei Coronel. Felizmente chegou a hora, a hora a hora de ver o Coronel sorrir, sorrir morrendo. Não sorrir de alegria por matar os outros pra roubar, agora é sorriso da morte, Coronel, que deve ser mais gostoso!

            Os pistoleiros com as mãos pra cima só esperavam o momento de morrer.

            - Você, pistoleiro velho, como se chama?

            - Antônio.

            Juliano deu um tiro na testa de Antônio e disse:

            - Chama-se agora é finado Antônio.

            Juliano olhou para João e disse:

            - Águia, foi você que me deu força e coragem para enfrentar estes pilantras. Estou muito orgulhoso de você. Gostaria que você matasse também uns destes pistoleiros, deixe o Coronel que eu cuido dele. Divirta-se um pouco com estes pistoleiros que ao invés de cuidarem de suas famílias vivem matando gente pra estes Coronéis safados

             - Obrigado, Juliano. Eu estava mesmo ansioso pra atirar. João, olhando para cada um dos pistoleiros perguntou:

             Gente, na verdade eu não tenho nada contra vocês, mas ao mesmo tempo, posso ter. Eu não sei que sou. Perdi minha memória e será que por acaso algum de vocês já me viu antes?

             Todos responderam ao mesmo tempo:

            - Não.

             - Ótimo, já que é assim, adeus amigos!

            E sacando de seus dois revólveres, num só instante, deixou doze pistoleiros estendidos.

            - Boa pontaria, Águia. Gostei mesmo de sua agilidade -  Falava Juliano indo em direção ao Coronel Garcia.

             - Juliano, não vamos matar o Coronel. Vamos levá-lo pra sua casa.

             - Por que, Águia?

            - Quero que todos o vejam vivo.  

            Neste instante, vinham chegando os demais companheiros deles, e João ordenou a uns cinco deles:

            - Vocês vão à cidade ver como Júlio se saiu. Se precisarem de ajuda venham nos avisar. Vamos voltar pra casa e se não precisarem de ajuda digam ao Júlio que vá pra lá depois que nomear as pessoas para os cargos.

             - Sim, Águia - Responderam os pistoleiros.

             - Vamos, Coronel, pra casa do Júlio. Quero fazer uma grande festa, comemorando a nossa vitória.

            Fizeram uma grande fogueira no pé de um ipê, amarrando ali o Coronel Garcia. Enquanto o fogo subia pela arvore, fazendo o Coronel pagar os seus pecados, a multidão pulava e cantava ao redor como se fosse uma grande tribo de índios...

            Só cinzas restaram do Coronel Garcia. Muitos pistoleiros ainda estavam desacordados e outros sonolentos com os olhos vermelhos de brincar a noite toda, de festejar algo que parecia impossível. Conseguiram se livrar de um Coronel que vivia escravizando seu povo e tomando conta de tudo sem piedade, mandando matar como um verdadeiro rei.  

            - Júlio, está tudo acabado. Agora o Coronel Garcia já não existe. O vento está levando pra bem distante cada parte dele. Este, eu tenho certeza, nunca mais vai matar ninguém pra ficar com suas terras.

            - Certo Águia. Sou muito grato a você por tudo.

            - Nada a agradecer, Júlio. Só fiz o que devia ter feito, afinal eu nem sei que sou! Mas não é preciso saber que é pra ver que esta violência não podia continuar.

            - E o que vai fazer agora, Águia?           

            - Vamos fazer a reunião na cidade, ver quem sobrou da tragédia e fazer um balanço de tudo.

             - De acordo, Águia. Estou de acordo.

            - Antes, Júlio. Vou à casa do senhor Francisco buscá-lo pra reunião. Você pode preparar o pessoal e nos encontraremos lá amanha.

             - Aguardamos você lá!     

            João saiu dali com a mente confusa. Depois de tudo o que havia acontecido sua vida ainda continuava um mistério. Ninguém sabia que era ele.

            - Vem vindo o Águia, mãe. Lá vem ele!  Flor saiu correndo pra porteira do quintal ao encontro do João que, desmontando do cavalo, abraçou a moça e disse:         

            - Minha querida! Eu já estava com saudade de você!

            Era a primeira vez que João demonstrava amor por Flor. Jurema vendo o rapaz abraçar a filha, também foi ao seu encontro.

            - Águia, como foi lá? Deu tudo certo, do jeito que você queria?

            - Nem tudo senhora. Eu sai daqui e logo na primeira casa fiquei conhecendo Júlio e seus irmão. Seu pai tinha sido assassinado há poucas semanas atrás. Assim, nós resolvemos juntar um grupo e atacamos a cidade e o Coronel Garcia.

            - E aí o que aconteceu?

            - Deu tudo certo, acabamos com o Coronel e mesmo assim, fiquei triste.  

             - Por quê?

            - Ninguém sabe quem sou. Ninguém, nem mesmo os pistoleiros do Coronel Garcia souberam que era eu.

            Neste momento, Francisco vinha chegando da roça. João vendo Francisco entrando no quintal sentia que teria agora, a partir daquele dia, uma vida melhor.        

            - Ô Águia, como foi lá?     

             - Fui bem, senhor Francisco. Deu tudo certo, só que ainda não consegui descobrir que sou.

             - Mas você vai conseguir descobrir quem é.

             João contou tudo que aconteceu ao Francisco.

             - Então foi isso, senhor Francisco. Amanhã tenho um encontro com o pessoal na cidade e eu quero que o senhor esteja lá junto com a senhora Jurema e Flor.

            - Certo Águia. Mas foi preciso fazer deste jeito, não havia outra forma?   

             - Qual senhor Francisco?

             - Sim. Águia, na verdade, não havia outro jeito. Tinha que ser assim, porque o que os Coronéis fazem só mesmo suas mortes podem pagar. Pagar não paga, mas pelo menos não fazem mais, destes estamos livres!

             A noite escura convidava para recolher e sentados ao redor do fogão, João conversava com Flor e seus pais.  Francisco contava caso de assombração. Flor sentia medo, porém se protegia nos braços de João, o seu querido Águia. Era um amor estranho, João gostava dela e, ao mesmo tempo, ele estava preocupado em descobrir quem era ele. Flor, no entanto procurava mudar de assunto e tentava levá-lo a acariciá-la.

             - Já está tarde, Flor. Temos que dormir, pois amanhã partiremos bem cedo.

            - E tem que ser amanhã, Águia?

             - Sim, tem que ser amanhã.

            - Eu gostaria de ficar e nunca saí daqui. Do jeito que vocês falam da cidade, dos Coronéis, eu prefiro ficar aqui só pra não ver este tipo de gente. Aqui eu vivo tão bem com a natureza, não tem ninguém pra me incomodar. Não tem nenhum idiota da cidade metido a sabido, cheio de grandeza e atrapalhando a vida dos demais. Idiotas que ganham, às vezes, o alimento para matar o irmão pros Coronéis, que ocuparem seus castelos. Eu tenho medo, Águia, muito medo...

            - Sim, querida, eu concordo com você. Sei perfeitamente o que está sentido, mas nós temos que ir. Muitos que já perderam a batalha estão lá esperando que um dia alguém vai chegar e este alguém tem que sair daqui. Isto foi o que aconteceu, Flor. Nós fomos lá e acabamos com o Coronel e os seus bajuladores. Tivemos que matar, pois não tinha outro jeito. Este tipo de gente Flor, não pode ficar vivo, é como se fossem cobras, tem que ser eliminadas e quando as pessoas do mundo inteiro se conscientizar que temos que acabar com os exploradores, corruptos e os Coronéis, tudo será calmo e bonito e todos serão iguais e viverão em paz.

            - Pode ser Águia. Mas o ideal seria que todos pudessem ser felizes, sem precisar sair por ai matando.

            - É, seria, mas não é possível. Ninguém colabora! Quando, às vezes, um tem boa intenção outro procura se aproveitar e acabando em problemas.

  - Águia, sinto que você é um homem inteligente. Perdeu a memória, mas é uma pessoa perfeita. Como você consegue ser assim?

            - Flor, eu não sei. Deve ter alguma coisa que não depende de mim.

            - Águia, sinto que você é um homem inteligente. Perdeu a memória, mas é uma pessoa perfeita. Como você consegue ser assim?

            - Flor, eu não sei. Deve ter alguma coisa que não depende de mim. Algo difícil de explicar, uma coisa espiritual, talvez. Eu não sinto que sou uma pessoa perfeita, tenho visões e sinto que meu pai ainda vive, mas não em nosso plano. Ele vive em outro lugar ou talvez não viva, mas sei que ele me criou ou não foi ele, será que dá pra entender? Uma missão. É eu acho que a gente vive cumprindo missões. Eu estou aqui cumprindo uma missão e não devo ainda saber quem sou. Logo que a missão terminar eu saberei. Talvez seja por isso que as pessoas sofrem enquanto não merecem isto, depende de sua missão.

            - Está na hora de dormir, filhos - Falou Jurema olhando o casal com alegria.

            - Boa noite, filhos - Falou Francisco indo pro quarto.

             João também deu boa noite e foi dormir. Flor foi pro seu quarto pensativa, imaginando como seria a cidade que iria conhecer no dia seguinte...

            - Agora que estamos todos reunidos aqui temos que decidir os verdadeiros caminhos que havemos de seguir. Gostaria que cada um de nós meditasse um pouco de modo a encontrar um meio de critério e responsabilidade para sermos um povo feliz, um povo alegre e amigo. Sabemos que este é um momento de grande satisfação, pois são poucas as oportunidades na vida e a nossa vida no proporcionou esta. Na verdade, estamos sorrindo e ao mesmo tempo chorando a morte de muitos dos nossos companheiros na luta pra acabar com o Coronel Garcia. Que eles tenham um bom lugar em suas vidas eternas e querendo alertar aos que ficaram que temos que ser amigos para sermos felizes.

            João explanou seu ponto de vista em tudo, os demais concordam e assim começou:

            - Os senhores que ficaram do nosso lado. Como padre André, o Doutor Eduardo e alguns comerciantes e professores, eu quero avisar-lhes que nós pistoleiros, não vivemos na fantasia. Somos extremamente realistas, honestos e lutadores, e contamos com a compreensão dos senhores para que no fundo não tenhamos o trabalho de matá-los como o Coronel e seus aliados. Queremos paz, igualdade e respeito, e seremos no futuro uma cidade próspera e reconhecida pela humanidade.

            E João acrescentou:

             - Júlio, eu gostaria de nomeá-lo para ser o delegado de nossa cidade!

            - Obrigado, Águia. Deveremos dar outro nome a esta cidade.

             - E qual seria o nome, Júlio?

            - Morada Nova.

            - Eu concordo com você, Júlio, é um bom nome.

             E Júlio gritou muito alto à multidão:

            - Concordam com o nome pessoal?

            Muitos gritaram concordando com o nome.

            - Júlio, eu gostaria que se possível, nomeássemos o senhor Francisco para prefeito da cidade.

            - Claro, Águia, afinal esta cidade agradece à sua coragem e tudo o que você desejar estará aqui para servi-lo.

            - Obrigado, Júlio e a todos vocês o meu muito obrigado.

            Uma parte da multidão reclamou alegando que quem deveria ser o prefeito seria o Águia.

            - Sim gente, concordo com vocês. No entanto, existem coisas que eu tenho que resolver. Eu vivo procurando quem sou!

            João abordou o assunto para a multidão e depois do relato, ele continuou:

            - Na verdade, ainda não encontrei ninguém que me conhece, nem sei se tenho pai ou mãe, mas devo ter já que eu não nasci do vento!

            Todos concordaram com João e ele continuou falando:

            - Temos também que agradecer aos nossos amigos que nos ajudaram na luta contra o Coronel Garcia. Colocando-nos à disposição deles na luta contra o Coronel Ozório. Estamos prontos, pois temos que acabar de uma vez por todas com este bando de Coronéis da face da terra. Coronéis que vivem escravizado nossos irmãos. Temos que acabar com eles!

            Neste momento, saiu da multidão um pistoleiro que seguiu em direção ao palanque e disse:

            - Águia, eu gostaria de falar um pouco, posso?

            - Pode amigo, aqui nesta cidade todos têm o direito de falar.

            - Obrigado, Águia.

            O pistoleiro disso com voz embargada de emoção;

            - Gente, sou Manoel, filho do senhor Messias. Coitado!

Era tão bom! Não por ser meu pai, mas era muito querido na região. Num maldito dia fomos à cidade, íamos desmontando dos nossos cavalos em frente ao bar do senhor Pereira, naquele instante, vinha chegando um bando de pistoleiros do Coronel Ozório e, sem mais nem menos, atiraram no meu pai. Eu consegui fugir com um tiro no braço, quando cheguei a casa ela não existia mais, só tinha cinzas e os corpos de minha mãe e meus irmãos estirados no chão. Sem lugar pra ir e sem  saber o que fazer, fui andando pelo caminho até que cheguei à casa de minha tia aqui perto da serra. Resolvi, então, acabar com o Coronel Ozório. Agora peço a vocês que me ajudem, pois se não acabarmos com ele logo estaremos todos mortos ou escravizados.

            Neste instante todos comovidos pelo apelo de Manoel gritaram:

             - Estamos de acordo!

            - Ótimo - continuou Manoel.

            - Mas temos que nos preparar, criar um plano.

             - Concordo Águia - Confirmou Júlio.

            - E como devemos treinar? - Indagou Juliano.

            - Treinando, Juliano!

             - Então, Águia, mãos à obra!

            - Certo, Manoel, enquanto é tempo, pois neste momento o Coronel deve estar matando alguém pra ficar com as terras.

            - E além das terras. Ele agora está ficando com a criação e levando as pessoas pra escravizar na lavoura.

            Combinaram os pistoleiros que logo iriam acabar de uma vez por todas com o Coronel Ozório. João, no entanto, ainda estava preocupado com a sua identidade. Vivia triste embora dando o treinamento junto com Júlio e o senhor Francisco, que mostrava as suas habilidades.

            - Águia, estou muito contente por estar ensinando a estes homens os truques para o combate.

            - Por que, senhor Francisco?

            - Por ter ficado tantos anos escondido na floresta só por não ter coragem de  enfrentar um Coronel. Hoje, Águia estou contente, contente por estar livre e podendo ajudar alguém.

            - É isto, senhor Francisco, a vida é assim. Eu acho que se todos os homens da terra pensassem desta forma e agissem em grupo não existiriam estes marginais que se dizem Coronéis que ficam ai impunes. Pelo menos em nossa região estas pestes vão acabar, temos que acabar com eles!

            - Do que fala tanto, Águia? - perguntou Flor abraçando o pistoleiro.

            - Falamos de liberdade, Flor, falamos de inteira liberdade...

            - E o que é liberdade?

            - É o direito de viver em paz, o direito de constituir família, de viver em grupo, de falar, de andar...

            - Como as aves, ser livres, viver cantando...

            Francisco deixou o rapaz conversando com a filha e foi ver Jurema. Os demais também conversavam com sua companheiras e na modesta cidade Morada Nova todos estavam felizes...

            Os sinos badalavam na torre da pequena igreja, fogos de artifícios confundiam-se com os raios de sol, amanhecia o dia em Morada Nova e o povo festejava um ano de independência.

            Todos seguiam em direção à praça central.

            - Águia, o pessoal está indo pra praça, o que devemos fazer?

            - Ver o que eles querem, senhor Francisco. Eles querem alguma coisa, temos que saber o quê.

            - Mas como vamos saber?

            - Indo lá também.

            E todos se reuniram na praça, fizeram algum tempo de silêncio, até que João comentou:

            - Felizes de nós, amigos, que estamos há um ano de liberdade. Acho que chegou o momento de vingar a morte do pai de Manoel. Podem se preparar, pois partiremos hoje, senhor Francisco!

            - Pronto, Águia, o que deseja?

            - O senhor já tem o plano pra acabar com o Coronel Ozório?

            - Tenho Águia. Já bolamos o plano, está tudo em ordem.

            - Águia, eu gostaria de falar um pouco, pediu Manoel.

             - Pode falar Manoel, a palavra é toda sua.

            - Obrigado, Águia. Eu queria dizer que estou muito satisfeito, gratificado por tudo que fizeram por mim. Se conseguirmos conquistar a cidade, vocês podem contar conosco. Estaremos lá ao inteiro dispor de todos vocês de Morada Nova.

            - Muito obrigado, Manoel - acrescentou o senhor Francisco.

            - E o que estamos esperando? -Argumentou Juliano.

            - Vamos à luta então! - sugeriu Juliano.           

             E todos falaram ao mesmo tempo:

            - Viva Morada Nova! Viva a luta, viva a independência!

            A partir deste momento, eles começaram a preparar os cavalos para partirem.

            - Estou com medo da luta, Águia.

            - Por quê, Flor?

            - Não sei, sinto que alguma coisa vai acontecer.

            - Não tenha medo, Flor, ninguém nunca deve ter medo de nada. Todos nós estamos subordinados à uma coisa chamada futuro e isto não nos pertence Portanto, querida, temos que ser fortes para conseguir o que queremos.

            João estava gostando de Flor, já pensava em deixar tudo aquilo de lado e ficar com ela pro resto da vida. Não lhe interessava mais nada, ela parecia completá-lo em tudo.

            - Águia, será que vai dar tudo certo?

            - Vai Flor, vai dar.

            João sentia que algo iria acontecer. Mas mesmo assim ele tinha que enfrentar, pois seu objetivo era, na verdade, descobrir quem ele era.

            - Francisco, eu estou muito preocupado com você!

            - Por quê, Jurema? Não vejo motivo para preocupação.

            - Não sei, Francisco, parece que algo ruim vai contecer.

             - Não Jurema, vai dar tudo certo.           

            A multidão de pistoleiros começava a se formar em frente à casa do senhor Francisco. Todos o tinham como pai, um pai de fé. E por outro lado, eles tinham por Águia uma enorme amizade, aquele com o seu jeito amigo de todo momento, era um verdadeiro companheiro que só falava da paz e liberdade, apesar de matar.

            - Águia, os pistoleiros estão se aglomerando. O que vamos fazer?

            - Vamos dar as ordens. Vamos atacar o Coronel Ozório antes de anoitecer e conquistar a liberdade do povo de Manoel. Eles nos ajudaram e devemos isso a eles.

            João saiu da casa junto com Francisco e, montando nos seus cavalos, disse:

            - Meus caros e ilustres companheiro, sei que este momento foi esperando por todos nós que desejamos paz e liberdade para nosso povo e unidos conseguiremos o nosso objetivo. Agora devemos partir para realizar mais um. Senhor Francisco, gostaria que o senhor desse as ordens.

            - Bem, gente, não tem nada difícil. Basta seguirmos o que foi combinado e tudo dará certo.

             - Vamos lá, pessoal! - Gritou Manoel alegre.

            Todos dando adeus aos que ficavam deixando somente o tempo coberto de poeira.

            - Senhor Francisco, vamos atacar a fazenda do Coronel?

            - Sim, Águia, Eu, você, Júlio, Juliano e alguns pistoleiros. Manoel e o restante vão atacar a cidade.

            - Manoel, eu gostaria de lhe falar.

             - Fale, Águia.

            - Nós não vamos matar o Coronel. Vamos levá-lo vivo pra cidade.

            - Cuidado com ele, Águia, é muito perigoso. Ao seu lado só tem pistoleiros famosos, todo cuidado e pouco.       

            - Certo, Manoel teremos cuidado  -respondeu o senhor Francisco.

            O sol já começava a descer no horizonte quando os pistoleiros já estavam nas terras do Coronel Ozório. Dividiram-se então em dois grupos onde a ordem era matar.

            - Águia, podemos preparar, estamos chegando.

            - Como vamos fazer, senhor Francisco?

            - Vamos atirar e jogar dinamites em todos os lugares. Não podemos vacilar, pois se errarmos o Coronel ganhará da gente. Dizem que ele é ás no gatilho.

             João, no entanto não tinha medo do Coronel Ozório. No tocante à agilidade no gatilho. Ele até gostaria de desafiar o  Coronel e, assim testar sua habilidade.

            - E o que estamos esperando?

            - Nada, Águia, estamos prontos  -responderam todos ao mesmo tempo.

            Já dava pra ver a fazenda do Coronel que se localizava na encosta da serra e em frente à sua casa estavam as dos pistoleiros.

            - Conforme o combinado, gente, podemos atacar - ordenou o senhor Francisco, sentindo um pouco de medo.

            Neste momento a coisa ficou feia. Os pistoleiros atacavam as casas dos capangas do Coronel, jogando dinamites e atirando em quem se via pela frente. Depois de minutos de batalha, muitos pistoleiros já estavam mortos de ambos os lados. João e o senhor Francisco cercavam a casa do Coronel pelos fundos e Júlio e Juliano foram pela frente.

            - Senhor Francisco. Me dê cobertura que vou entrar naquela porta.         

            - Cuidado, Águia!

            - Pode deixar, senhor Francisco, vou ter cuidado.

   Francisco deu cobertura para João e ele entrou, então numa pequena sala onde estava uma linda garota, João a agarrou e saiu com ela. Francisco veio correndo para ajudá-lo acabou levando um tiro e caindo no chão, gritava:

            - Fuja, Águia eles são perigosos!

            João, vendo o seu amigo caído no chão morrendo, se desesperou e arrastando a moça pro meio do quintal com o revolver na cabeça dela, gritava:

             - Coronel Ozório, saia da casa ou mato a sua filha.

            Enquanto isso atrás de João vinha um pistoleiro quando Júlio avisou:

            - Cuidado, Águia, nas costas.

            No mesmo momento João caiu no chão soltando a moça que foi alvejada pelo pistoleiro mas em seguida foi eliminado por João.

            - Cuidado Juliano! - João tentou avisar mais foi tarde demais.

            - Juliano! -  gritou Júlio desesperado ao ver o irmão morrendo.      

            - Júlio, vamos entrar na casa - convidou João demonstrando revolta.

            Os dois pistoleiros entraram na casa do Coronel, quebrando as portas dos quartos e fuzilando quem encontravam , como se fossem dois touros ou dois monstros.

            - Cuidado, Águia! - Gritou Júlio deitando-se no chão.

            João sacou seus dois revolveres e atirou. Mais acabou levando um tiro na mão, seu revolver caiu e o Coronel Ozório ria dizendo:

            - Águia, bonito nome, Águia!

            - Então o senhor é o Coronel Ozório?

             - Sou e vou matá-lo.

            Neste momento João atirou na mão do Coronel e os dos ficaram com uma das mão ofendidas.

            - Eu também atiro com a mão esquerda, Coronel. Por isso estou aqui, não ando só, sou o Águia. Na verdade Coronel, eu não sou Águia. Deram-me este nome porque não sei quem sou. Quem sabe o senhor saiba alguma coisa a meu respeito?

            - Não sei nada de ninguém. Por que não acaba logo com isso?

            - Não Coronel, não fique nervoso. Afinal, eu não tenho nada contra o senhor!

            - E o que quer de mim? Por que veio matar meus homens, porque veio acabar com tudo?

            - Vamos saindo, Coronel, lá fora conversaremos. Ordene ao seu pessoal pra saírem, vamos todos pro quintal!

            O Coronel Ozório gritou:

            - Atenção, pessoal, todos pro meio do quintal!

            Todos no meio do quintal e João comentou:

            - Gente, eu sei que se quiséssemos acabar com todos vocês já teríamos feito. Entretanto, eu preciso de uma informação.         Alguém de vocês, por acaso, já me viu algum dia?

            - Não, sue pistoleiro assassino! -  exclamou a esposa do Coronel.

            João disparou um tiro na testa da madame e disse:

            - Mulher é muito bom, mas educada e carinhosa. Este tipo de mulher, principalmente de Coronel que se acostumou na mordomia e não respeita as pessoas, tem que levar bala.

            - Águia, acho melhor irmos embora  relatou Júlio.     

            - Sim, amigo. Prepare um cavalo pro Coronel, vamos levá-lo pro Manoel, afinal eu prometi a ele. Vocês aí querem ir embora?  - perguntou João aos pistoleiros.      

            - Queremos - responderam todos ao mesmo tempo.

            - E pra onde vão se nem sequer tem um pedaço de terra? Vão procurar outro Coronel safado pra trabalhar seu otários? Vocês não merecem a vida, seu bando de pilantras, por que não estão trabalhando honestamente, com dignidade? Agora estão aí com estas caras de onça. Não têm vergonha de vocês mesmos seus vagabundos? Você ai, pegue uma corda e amarre os demais, ande!

            O pistoleiro amarrou os colegas e disse:

            - Pronto, seu pistoleiro desgraçado, estão amarrados.

            - Obrigado, mais não me chama de desgraçado. Se fosse um Coronel que estivesse mandando seria diferente, mas com sou um pistoleiro levo o nome de desgraçado e, na verdade, desgraçado é o Coronel.

            João sacou o revolver, fuzilando o pistoleiro e disse:

            - Júlio, coloque o Coronel no cavalo.

            - Sim, Águia. Vamos Coronel!

            João mandou os seus colegas colocarem fogo na casa e montou no seu cavalo. Ficou olhando as chamas subirem e gritou:

            - Todos vocês que lutaram comigo, em nome dos nossos colegas que morreram, joguem dinamites nestes pistoleiros amarrados!

            As dinamites explodiram tudo, as chamas acompanhavam a poeira, pintando um quadro de terror no céu.

   - Vamos, Águia já acabou. Vamos pra cidade  convidou Júlio.

            João não parecia querer ir, demonstrava um grande ódio vendo a fumaça subir no horizonte, murmurava:

             - Quem sou eu? De onde será que saí? De...

            Já tarde da noite, com a mão sangrando muito, João e Júlio chegaram à cidade com o Coronel Ozório. Foram direto pro bar onde o pai de Manoel tinha sito assassinado. A cidade, no entanto, parecia calma. Não dava pra notar que tinha acontecido ali nenhuma briga, nenhuma batalha.

            - Pessoal, amarrem os cavalos e depois amarrem o Coronel no mourão.

             - Eu e Júlio vamos ver quem está no salão.

            Os dois pistoleiros entraram no salão onde estava Manoel já bêbado.

             - Olhe quem está chegando, o Águia.   Vamos entrar, Águia, seja bem-vindo à minha cidade. Acabei com todos, só deixei uns amigos e as mulheres.      

            - E a cachaça - acrescentou João furioso.

            - Manoel, o Coronel está ai fora -  informou Júlio.

            Quando Júlio falou que o Coronel estava ali. Manoel saiu correndo indo direto ao encontro dele.           

            - Quanto tempo eu esperei por isso, Coronel! Agora posso matá-lo!

            Sacando uma faca ele apunhalou o Coronel sem piedade, em segundos ele deu muitas facadas no Coronel e todo sujo de sangue dizia:

            - Eu quero morrer, Águia. Estou feliz, quero morrer, já matei o Coronel, agora quero morrer. Águia, mate-me!

            - Não tenho motivo pra matá-lo Manoel.

            Manoel sacou sua arma e apontou para João, mas antes de apertar o gatilho, ele recebeu uma bala na cabeça.

            - Detesto homem que bebe  -argumentou Júlio guardando o revólver que ainda saia fumaça no cano.

             - Obrigado, Júlio - agradeceu João.      

            - E agora, Águia, o que devemos fazer?

            - Ordene ao Juscelino pra ficar no comando da cidade.       

            - Juscelino, a cidade é toda sua. Procure fazer como fizemos em Morada Nova, seja amigo de todos. Faça o povo feliz, o que precisar da gente estamos lá à sua disposição.

             - E que nome devo dar à cidade?

            - Sei lá, qualquer nome, um nome bonito?

            - Serra Bonita é um bom nome - acrescentou João.               - De acordo, pessoal, com o nome que o Águia sugeriu?

            - De acordo - todos responderam numa só voz.

            - Então é esse o nome da cidade.

            - Adeus, Juscelino!  - despediu João.

            - Adeus, Águia. Agradeço-lhe por tudo, amigo. Aqui você tem um amigo, o que precisar de mim estarei ao seu dispor.

            - Vamos Júlio, minha mão dói muito.

            - Vamos, Águia.

            - Vamos, pessoal! Adeus, amigos!

            - Adeus...

            Na madrugada escura, o cintilar das estrelas iluminavam o espaço fazendo com que a estrada ficasse cada vez mais escura. O tropel dos cavalos estrondavam ao longe na floresta. Antes do amanhecer chegaram à Morada Nova, onde muita gente esperava a chegada dos pistoleiros.

            - Júlio, vá pra sua casa que eu vou pra minha. Dispense o pessoal, deixe-os cuidar de suas vidas, acabaram as lutas.

            - E quanto a você, Águia, o que vai fazer?

            - Não sei, Júlio, ainda não sei.

            - Pessoal, podem ir embora cada um pra sua casa, acabou a luta.

            - E o Águia? Temos que ajudá-lo!

            - Obrigado, amigos. Acho que devemos descançar primeiro, depois resolveremos este assunto.

            - Certo, Águia. Adeus, amigos! - falaram em um só momento.

            - Adeus, Amigos.

            - Até mais, Águia.

            - Até mais, Júlio.

            João um pouco aborrecido, chegou em casa, desarreou o cavalo e soltou-o num mangueiro no final da rua. Quando de volta entrando na sala Jurema e Flor estavam chorando. João ia começar a falar mas Jurema antecipou-se:

            - Não, Águia. Nós já prevíamos que ele ia morrer, não precisa falar nada.

            - Foi mesmo muito triste a morte dele, eu o tinha como pai.

             Flor chorava desesperada dizendo:

            - Pai, meu pai, o que será de mim sem você?

            João abraçou Flor e disse:

            - Minha querida, não precisa chorar. Seu pai morreu lutando pra nos defender. Eu também gostava dele, devemos nos orgulhar dele!        - Eu sei, Águia, eu sei -  e Flor chorava...

            - E agora, Águia, ainda haverá luta? Descobriu quem é você?

            - Não senhora. Ninguém me conheceu.

             - E eliminaram o Coronel?

            - Sim, e todo o seu bando. Deixamos a cidade sob comando de Juscelino. Juliano também morreu.

            - E o Manoel também morreu?

            - Sim, quando chegamos à cidade ele estava bêbado. Matou o Coronel Ozório a facada e depois queria me matar. Então Júlio o matou com uma bala na cabeça.

            - Flor, faça curativo na mão de Águia -  ordenou Jurema sentindo pena do rapaz.

            - Sim, mãe. Eu vou cuidar dele.

             - Obrigado, Flor, você é uma Flor.

            - Que nada, Águia. Eu sou uma pobre filha sem pai.

            - Mas tem mãe e amigos. Estamos numa cidade calma e sem Coronel, foi o que ele nos deixou.

            João aconselhou a moça, enquanto ela cuidava do seu ferimento demonstrando carinho. Parecia nascer uma outra vida, um outro relacionamento entre os dois.

            Um ano depois, João já curado da mão, exercitava os seus revolveres como se fossem de brincadeira. Estava, então pronto pra saber quem era ele. Só podia ser da região do Coronel Horácio, tinha que ser ali o seu lugar. Restava saber se ainda tinha pai e quem era.

            - Senhora Jurema, hoje eu vou partir. Vou lá pra região do Coronel Horácio ver se descubro quem sou.

            - Tem que ir mesmo, Águia?

            - Sim, senhora. Tenho que ir.

             - Águia, vou ficar com saudades de você.

            - Eu compreendo, Flor, Porém, tenho que saber quem sou se não descobrir isso não poderei viver tranqüilo, sempre estará me faltando algo.

            João montou em seu cavalo e saiu. Jurema e Flor ficaram acenando com as mãos e nos olhos de Flor brotaram as lágrimas

            - Ah! Meu Deus, será que vou descobrir quem sou? - Perguntava João a seu Deus na floresta.

            Os dias se passaram até que...

            - Bom dia, senhor?

             - Bom dia, vaqueiro. O que deseja?

            - Eu ando à procura de mim, quero dizer, de quem sou. Sei lá como explicar, na verdade, é que eu não sei quem sou.

            - Como? Não entendo, você não sabe quem é e quer que eu saiba? Você deve estar louco!

            - Não, senhor, não é caso de loucura. Eu perdi a memória e me esqueci quem sou, mas não sou louco. Sei tudo o que  faço, só não sei de onde vim.

            - Não endendi.

            João, então contou o caso ao moço.

            - Já entendi. Você foi atacado, deve ter fugido e perdeu a memória. O que você tem que fazer e descobrir quem é você.

            - Sim, é isto mesmo e como vou decobrir?

            - Analisando.

            - Analisando?

             - Sim, analisando os fatos.

            - Ah! Sim. Endendi! Digamos que se eu fosse desta região de quem eu poderia ser filho?

            - Isso mesmo. De quem você acha que é filho?

            - Não sei, não sei de nome ninguém por aqui.

            - Vejamos se posso lhe ajudar. Quantos anos você acha que seu pai se estiver vivo terá?

            - Uns cinqüenta anos, talvez.

            - Então você não tem mais pai.

            - Por que tem tanta certeza?

            - Há aproximadamente uns dez anos atrás, um Coronel chamado Horácio chegou a esta região,  matou todos os fazendeiros e ficou com as terras, hoje ele vive numa grande fazenda e comanda todo este vale, todos aqui são empregados dele.

             - Mas ele manda na cidade também?

            - Sim, é um arraial. Aqui tudo é dele.

            - E você sabe de onde veio este Coronel?

            - Não, eu sou novo aqui. Vim da região beira-mar.

            - E o que o senhor faz aqui?

            - Trabalho pro Coronel. Fiscalizo as propriedades.

            - Então o senhor conhece tudo na região?

            - Conheço.

            - Seria possível o senhor me contar tudo?

             - Sim.

            O homem contou tudo a João.

             - O senhor sabe se este Coronel matou os fazendeiros?

            - Sim, ele matou todos e queimou suas casas. Ele é muito covarde.

   - Então ele merece morrer!

            - Quem merece morrer é você, pistoleiro mal-criado! - retrucou o homem sacando seu revolver.

            - Calma amigo! - respondeu João dando um tiro no peito do homem.

            Quando o homem caiu no chão, a mulher e os filhos correram dizendo:

             - Seu pistoleiro do meio dos infernos!

            João respondeu:

            - Calma senhora. Não vou matá-la. Vá avise ao Coronel que o Águia chegou.

            Depois que João falou, a mulher saiu com destino à casa do Coronel, enquanto João seguiu outro destino. Vários meses se passaram e João atacando os pistoleiros do Coronel. Um dia ele resolveu ir ao arraial, pois os pistoleiros praticamente já havia acabado.

            - Olá, senhores  - João cumprimentou os pistoleiros que bebiam no bar.

            - Bom dia, vaqueiro - responderam os pistoleiros.

            Um pistoleiro já maduro se dirigiu a João e disse:

            - O que procura?

            - Procuro emprego. Disseram-me que nesta região tem um Coronel muito bom, eu gostaria de pedir um emprego a ele.

            - Aqui precisamos de pistoleiros e não de vaqueiro.

             - Eu sou um pistoleiro.

            Quando João falou que era um pistoleiro os homens riram e disseram:

            - O vaqueiro é pistoleiro!

            João não gostou do que eles disseram, sacou seus revolveres, eliminou os pistoleiros mais uns quatro em seguida disse:

            - Nunca gostei de ver um homem rindo do outro.

  O velho pistoleiro, vendo a agilidade de João, disse:

            - Você está empregado, eu sou o capataz do Coronel. Eu me chamo Agenor.

             - Certo, Agenor. Onde está o Coronel?

            - Na fazenda Segredo. Vou levá-lo a ele.

            João saiu com Agenor em direção à fazenda Segredo. No caminho João começou a interrogá-lo.

            - Agenor, por que está me levando ao Coronel? Ele está mesmo precisando de pistoleiro?

            - Sim, está. A alguns meses vem acontecendo muitas mortes e os pistoleiros do Coronel estão no fim.

            - No fim? Por quê?

            - Um pistoleiro chamado Águia este é o recado que ele manda pro Coronel mas, na verdade ninguém sabe que o é, o certo é que ele já matou muita gente.

            - Águia, bonito nome! Águia -  acrescentou João.

            - Se eu ao menos soubesse quem é este pistoleiro...

             - O que faria com ele, Agenor?

            - Não sei, nem sei o que faria!

            - Agenor, tem muito tempo que você é capataz do Coronel?

            - Muito tempo, desde que ele veio da região beira-mar. Chegamos aqui tinha uns fazendeirinhos. Matamos todos eles e ficamos com as terras.

            - Você se lembra de algum nome dos fazendeirinhos que vocês mataram?

            - Só de um, o Januário, coitado! Eu não queria que o Coronel o matasse. Demos até um prazo pra ele ir embora mas não quis sair. Mandou um recado malcriado pro Coronel, ele não gostou, ficou nervoso e acabou matando o coitado.

            - Este fazendeiro tinha filhos?

            - Tinha um casal.

             - E todos morreram?

             - Morreram, pusemos fogo na casa.

            - Agenor, será que você poderia me levar ao lugar onde era a casa do fazendeiro?

            - Nós vamos passar lá. Está quase chegando.

            Quando eles chegaram ao local, João reconheceu o lugar, e lembrou-se de tudo e exclamou:

            - É isto, Senhor! Agora já sei quem sou. Obrigado, Senhor! - agradeceu João ao seu Senhor, tirando o chapéu da cabeça.

            - O que está dizendo - perguntou Agenor.

            - Nada, Agenor, não é nada. Eu só estava admirando a natureza.

            João estava triste e ao mesmo tempo feliz. Sabia que seu pai morreu lutando por ele e agora tinha que vingar sua morte.

            Era uma bonita tarde. A fazenda Segredo se escondia do sol quente entre as enormes mangueiras. Nas suas sombras, deitado em uma rede, estava o Coronel Horácio.

            - Coronel, trouxe este pistoleiro -  disse Agenor, apresentando Joao ao Coronel.

            - De onde veio, pistoleiro?

            - Coronel, o senhor precisa de pistoleiro ou não? 

            -Preciso.

             - Então que diferença faz de onde eu vim ou pra onde vou?

            - Eu sou o Coronel Horácio, pergunto o que quero e a quem bem quero - dando sinal pra dois guarda-costas atirarem em Joao.

            Os pistoleiros sacaram as armas mas foram surpreendidos com um tiro na cabeça.

            - Coronel, eu não ando brincando. Sou um pistoleiro e não estou aqui pra brincar

            - Argumentou João atirando em mais dois pistoleiros que estavam em suas costas.

             - Certo, pistoleiro. Eu compreendo -  respondeu o Coronel.

             - E então, Coronel, qual vai ser o serviço?

            - Você tem que acabar com um desgraçado que vive eliminando os meus homens.

            - Ótimo, Coronel. Mas só farei isto ganhando muito dinheiro. Nunca gostei de trabalhar de graça e também nunca gostei de Coronel, detesto Coronéis.

            - E quanto você quer pra fazer o trabalho?

            João pediu uma soma, sabendo que o Coronel não tinha.

            - Você é doido! Eu não tenho este dinheiro.

            - Quanto você tem então. Coronelzinho de meia tigela?

            Quando João falou desse jeito, uma linda garota numa janela disse:

            - E o respeito, pistoleiro, acabou?

            - Desculpe-me, senhorita eu não vi que esta beleza estava aí.

            - Coronel, acerte logo com o pistoleiro. Precisamos de sossego - acrescentou Agenor.

             - Combinado, pistoleiro?

            - O que está combinado?

            - Eu tenho a metade do dinheiro.

             - Onde está, então?

             - Lá dentro.

            - Então vamos lá.

            - Só depois que você trouxer o desgraçado do pistoleiro aqui.

            - Não trabalho desta forma. Coronel. Só trabalho com o pagamento adiantado.

             - Você é um pistoleiro diferente?

            - Sou diferente. Vamos logo!

            O coronel, então foi até o dinheiro. João acompanhou assim como Agenor e a filha do Coronel.  Ainda estava lá fora uns oito pistoleiros que seria facilmente liquidados por João.

            - Aí está, pistoleiro, o dinheiro - Falou Coronel pondo um saco de dinheiro sobre uma grande mesa de aroeira.

            - Coronel, onde tem um saco de dinheiro tem mais. Este dinheiro é pouco pra enfrentar um trabalho tão perigoso!

            O coronel voltou ao quarto, trouxe outro saco de dinheiro e disse:

            - Satisfeito, seu pistoleiro exigente?

            - Está bom, Coronel!

            João apanhou os sacos de dinheiro e, ia saindo da sala quando o Coronel lhe perguntou:

            - Pistoleiro, afinal fizemos um negócio e não sei seu nome

            João virou-se deixou os sacos de dinheiro caírem, sacou seus dois revólveres e disse:

            - Meu nome é Águia, quero dizer, me chamam de Águia. Meu nome verdadeiro é João, sou filho de Januário que o senhor há mais de dez anos atrás. Naquele dia, quando o senhor atirou em meu pai, enquanto os pistoleiros queimavam minha irmãzinha e minha mãe, eu estava escondido numa moita de cana. Eu consegui pular a janela e fugi pela floresta afora. Atravessei a montanha, fiquei doente, perdi a memória e não sabia quem era. Passei estes anos todos matando as pessoas e tentando descobrir quem era eu. Hoje, quando vinha pra cá, Agenor me mostrou o local em que morava meu pai, onde nós morávamos. Éramos uma família feliz, pobre mas mesmo assim éramos felizes. Meu pai nos contava histórias, brincava com a gente, pena que durou tão pouco...

            - Vamos, Águia, acaba logo com isso.

            - Chame-me de João. Nem sei o que dizer, resolva o que quiser.

            Neste instante Agenor gritou:

            - Cuidado, João!

            João abaixou-se e o tiro acertou numa moça. João pulou por cima da mesa e deu dois disparos, acertando Agenor e a mulher do Coronel que havia atirado primeiro.

            - Só resta o senhor, Coronel. Mande os pistoleiros entrarem desarmados e com as mãos para cima.

            O coronel ordenou aos pistoleiros.

            - Agora, Coronel, amarre-os e logo!

            Depois dos pistoleiros amarrados, João mandou o Coronel jogar dinamite na casa inteira e disse:

            - Pronto, Coronel. Ainda tem dinheiro lá dentro, apanhe o resto pois vamos embora.

            O Coronel apanhou o restante do dinheiro, João ordenou que o colocasse numa carroça juntamente com umas ferramentas.Enquanto isso ele preparava uma flecha e jogou pólvora no quintal.

            - Tudo certo, Coronel, podemos ir.

             - Pra onde vamos?

            - Pra casa do meu pai.

             - Mas seu pai não tem casa, você nem tem pai.

            - Mas tenho o lugar, vamos pra lá.

            João já bem distante jogou a flecha com fogo e viu a casa do Coronel transformar-se em pedaços com os pistoleiros e tudo.

            - Por que fez isto? - Perguntou o Coronel.

             - Pra vingar a morte de minha irmãzinha e minha mãe.

            - E seu pai, você não fala nada?

            - Não, agora não.

            Chegando à tapera, João mandou o Coronel cavar um buraco onde há mais de dez anos atrás ele atirara no seu pai. Depois que o Coronel cavou o buraco, perguntou;

            - Pra que este buraco, João?

            - Pro senhor, Coronel. Entre nele que vou lhe dar o dinheiro de Coronel safado. Posso viver pobre o resto da vida mas não vou roubar de ninguém. Muito menos de um Coronel que, na verdade nem é Coronel. Usa este titulo porque tem dinheiro roubado.

            Depois que João enterrou o Coronel vivo junto com o dinheiro, ele escreveu sobre a terra: “pai eu não vinguei a sua morte, deixei que o senhor mesmo o fizesse”. Depois que acabou de escrever, ele montou em seu cavalo e foi andando, andando, andando...

                       

 FIM

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